quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Sistema de ciclos não piora ensino, diz estudo

ANTÔNIO GOIS
da Folha de S.Paulo, do Rio

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Poucos debates educacionais mobilizaram tanto recentemente a sociedade quanto a adoção do sistema de ciclos. Objeto de discussões acaloradas em debates eleitorais, muitos políticos acusaram o modelo de ter piorado a qualidade de ensino com a "aprovação automática" de alunos sem base.
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Um estudo a partir do desempenho de estudantes na Prova Brasil (avaliação do MEC que monitora a performance de alunos em português e matemática) traz um pouco de luz à discussão, mostrando que praticamente não há diferença nas notas em sistemas de ciclos --em que a reprovação não ocorre todo ano- e seriados.
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O trabalho foi elaborado pelos pesquisadores Naércio Menezes Filho (USP e Ibmec), Lígia Vasconcellos, Sérgio Werlang e Roberta Biondi (os três últimos do Banco Itaú).
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Pela primeira vez, eles utilizaram dados da Prova Brasil para comparar os sistemas.
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A primeira comparação feita pelos autores do estudo é favorável aos alunos no sistema de ciclos, pois mostra que o desempenho deles nas provas de português e matemática é melhor, variando de uma diferença de 0,9% (na prova de matemática na 8ª série) para 4,4% (em português na 4ª série).
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Nível socioeconômico
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Isso, no entanto, não é suficiente para comprovar que o sistema de ciclos seja melhor, já que a diferença poderia ser devida ao fato de esses estudantes terem nível socioeconômico mais elevado e estarem em escolas mais bem equipadas.
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Para captar melhor o efeito dos ciclos, os autores refizeram o cálculo, mas, desta vez, levando em consideração características das escolas e das famílias -que, já se sabe, têm peso significativo no rendimento.
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Em outras palavras, eles comparam estudantes nas mesmas condições e com mesmas características.
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O resultado mostra que a diferença passa a ser favorável a alunos no sistema seriado, mas é mínima. Na 4ª série, as notas dos estudantes em escolas que adotam o sistema seriado foi apenas 1% superior, diferença que fica dentro da margem de erro do levantamento.
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Já na 8ª série, a diferença é um pouco maior: 1,8% em matemática e 1,4% em português.Os autores do estudo fazem uma leitura favorável desses dados ao sistema de ciclos. Eles mostram que as taxas de reprovação e abandono são menores nesse regime, o que faz com que mais alunos consigam completar o ensino fundamental.
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Argumentam ainda que, mesmo com a queda na qualidade, os efeitos futuros no rendimento de um estudante formado no sistema de ciclos compensam a pequena perda de rendimento, já que, quanto mais escolarizado, maior é a renda do trabalhador.
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Eles levantam duas hipóteses para o desempenho ligeiramente menor na 8ª série. A primeira é que, no sistema de ciclos, há menos empenho do estudante ao saber que ele não será reprovado todo ano.
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A segunda é que, nesse regime, mais alunos de menor nível socioeconômico conseguem chegar à 8ª série, o que acaba tendo impacto nas médias da turma. No sistema seriado, argumentam, esses jovens provavelmente já teriam abandonado a escola ou estariam retidos em séries mais atrasadas.
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Lígia Vasconcellos diz que não deve se esperar que a simples adoção de ciclos aumente o desempenho. "É preciso ter mais qualidade, mas não é a progressão continuada que vai explicar a melhora ou a piora."
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